domingo, 29 de junho de 2008

Jó e o problema do problema do mal

Algo que sempre me irritou é o mito evangélico de que Jó é um bom livro para se ler quando enfrentando dificuldades, porque ele explica porque Deus permite que coisas ruins aconteçam. O fato é que a vontade de Deus é um mistério, e a única resposta que Jó oferece nesta direção- que Deus permitiu que coisas horríveis acontecessem com Jó por causa de uma aposta com o Diabo- é mais assustadora do que consoladora.

Jó não explica porque coisas ruins acontecem; esta não é a mensagem do livro, e nunca foi. Jó passa o livro inteiro clamando por uma resposta, e defendendo-se de acusações vindas dos piores consoladores do mundo. Mas quando Deus finalmente chega, Ele não afaga a cabeça de Jó e explica tudo. Ele vem num redemoinho e diz- se vocês me permitem resumir numa frase o que Ele elabora em quatro capítulos- Cale a boca, Jó; Eu sou Deus. Se houve uma pessoa no mundo a quem Deus já deveu explicações, esta pessoa foi Jó (se, é claro, Jó foi uma pessoa real). E irônicamente, com todos os bilhões que já conheceram sua história, e sabem o motivo pelo qual Deus permitiu sua tragédia particular, não temos justificativa para acreditar que o próprio Jó um dia descobriu o motivo. Deus tem toda a oportunidade para explicar, mas ele insistentemente se recusa. E ainda repreende Jó por sua insolência.

A mensagem de Jó não é a resposta do problema do mal; a mensagem de Jó é que o problema do mal não é da nossa conta. A mensagem assustadora de Jó é que Deus não se preocupa em satisfazer nossa busca por respostas; nem pelas perguntas que esmagam nosso coração. Quando o assunto é o problema do mal, Deus trata seus advogados com o mesmo desdém que seus acusadores, e a todos os que tentam chegar a fórmulas conclusivas sobre uma questão que existe por milênios, Deus responde com sarcasmo quase cruel; "De certo tu o sabes, porque já então eras nascido, e porque é grande o número dos teus dias!"

A mensagem de Jó (se vocês me permitem dar diversas e distintas definições conclusivas sobre o assunto) é que temos que confiar em Deus, mesmo quando ele deliberadamente ignora nossas perguntas; confiar em Deus mesmo quando, e especialmente quando, nada faz sentido. No final das contas, a única confiança real é a confiança que sobrevive mesmo quando tudo nos faz desconfiar. Como Chesterton já sugeriu, as virtudes* só existem realmente quando são postas á prova: o amor só é amor real se ama aquilo que não merce ser amado, a fé só é real se crê na cara do silêncio divino, a esperança só é real se persiste apesar de toda circunstância. E Jó provou que realmente era o mais reto dos homens ao amar, confiar, e esperar num Deus que lhe deu todos os motivos para amaldiçoá-lo. A leitura de Jó é importante, não porque responde ao problema do mal, mas porque mostra que é possível confiar em Deus apesar do problema do mal.

* Originalmente estava "Virtudes Cardeais", até que o virtuoso Igor Barbosa me lembrou de que as virtudes cardeais são outras. Na dúvida, e com pouco tempo, deixo no genérico "virtudes".

sábado, 28 de junho de 2008

Corrigindo trabalhos

Uma coisa que me surpreendeu neste primeiro semestre como professor é como alguns alunos são preguiçosos para colar. A grande maioria (pelo menos até onde eu saiba) dos meus alunos tem sido honestos comigo, e muitos dos trabalhos estão muito bons; mas vários trabalhos são obviamente plágios de cópias de páginas da internet, em alguns casos arrancados palavra por palavra daquela mais segura de todas as fontes: A wikipédia. Não estou surpreso por alguns puxarem parágrafos inteiros da wikipédia para seus trabalhos; mas eles me acham tão besta a ponto de não reparar as similaridades entre seus artigos e os verbetes didáticos da wikipedia? Eles acham que eu nunca entrei na internet, ou são os trapaceiros mais incompetentes que já viveram?

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Minha intenção não é- e de fato nunca foi- insultar qualquer um dos meus alunos, que são, em sua vasta maioria, dedicados e apaixonados pela teologia e por Deus. O post foi apenas escrito num momento de frustração; e acreditem, é frustrante ver alunos que você respeita colando. Quem sabe eu sou novato e bobo demais, e por isto não consigo enxergar isto como normal e aceitável, não sei. Só sei que não consigo. Não num curso superior. E não, pelo amor de Deus, num curso de teologia.

sexta-feira, 27 de junho de 2008

Ah Sim! A proper introduction.

Agora que já temos quatro posts no blog, acho que é hora de, bem, um post de inauguração. Esta é uma reciclagem de um projeto que nunca foi pra frente por falta de tempo e compromisso dos participantes. Ok, ok, por falta de compromisso meu. Eu (que agora estarei aqui em tempo integral), Igor, Gustavo, e Éber somos os quatro charter members, os cavaleiros do apocalipse, os fab four.


De esquerda para a direita: Éber, Gustavo, João e Igor.

Eu estou animado. Ser um Ringo Starr nessa vida não é fácil, ainda mais quando cercado pelos Lennons, Harrisons e McCartneys do mundo. Mas pode ser divertido.

A arte evangélica

Oba, eu faço parte deste blog! Acho que eu tenho que escrever alguma coisa por aqui também, então eu resolvi escrever... Não sabia muito bem o que ia dizer, pois perto de "monstros" (não estou me referindo aqui a aparência física, mesmo porque nunca os conheci ao vivo... Pelas fotos, ninguém é tão monstruoso assim) "literários" que são o João, Igor e Nagel, meus textos não são lá grandes coisas. Mas eu vou me esforçar, eu prometo! Minha principal inspiração, até agora, foram os ótimos textos já publicados nesteblog.

Lendo o post do Igor e do João, me lembrei que uma vez eu fiquei com muita inveja dos católicos. Por quê? Ah! Porque as coisas deles são tão bonitas! Entre numa igreja católica, que coisa mais linda! Aquela arquitetura, as pinturas, os vitrais, os rituais, os trajes. É tudo tão legal e bonito! O papa e aquele chapéu grande! Os franciscanos com aqueles roupões marrons e cordinhas na cintura... Também existem os mistérios! A Opus Dei, a biblioteca do Vaticano e tantas coisas bacanas! Não estou falando que nada disso tenha algum valor espiritual que vá colocar os católicos na frente da fila pra entrar no céu. Não é isso. O legal é ver como os católicos contribuíram para a cultura geral. Daí eu olho pro povo evangélico num esforço de reconhecer alguma coisa bacana assim e não consigo encontrar nada. Talvez seja minha própria ignorância. Você conhece algo?

Me sinto um pouco deprimido quando olho pros católicos e vejo em seu arraial de artistas como Caravaggio, Michelangelo, Leonardo e todos aqueles artistas renascentistas. Posso ver obras como o teto da Capela Sistina e a escultura de Davi, os profetas de Aleijadinho. Enfim... Quando olho pro povo evangélico, parece que tenho que me limitar à música (porque é difícil evangélico fazer outra arte além da música) onde encontro artistas como... Cassiane. Nada contra a Cassiane! Mas eu acho que deu pra entender o que eu quis dizer. Parece que no meio evangélico a arte é um meio de atração ao invés de ser a simples expressão daquilo que o artista sente. O problema é que não se entende o poder que a simples expressão do sentimento tem. Quando se tem todo o amor de Deus na vida e reconhecemos seu sacrifício, a arte, pura e simples, é um testemunho muito forte! São motivos especiais e relevantes. Enquanto os católicos fazem pinturasmagistrais, nós fazemos música que rimam "Jesus" com "Cruz" com "Pus" e colocamos fogo, chuva, vento, todas essas palavrinhas no meio.

Arte não é marketing pra trazer visitantes pra igreja. Onde estão os pintores, escultores, poetas e escritores evangélicos? Como deve ser a arte do cristão? Acho que foi Francis Schaeffer que disse que a arte cristã deve ser algo como no movimento naturalista, onde a natureza é representada de forma pura e fiel, enaltecendo assim a criação de Deus, e por conseqüência, o próprio Deus. Faz sentido, mas eu acho que a galera pode pirar e fazer coisas diferentes também né? Ou não? Sei lá...

Ah! Vale lembra que J. S. Bach era protestante e tem muita coisa legal dessa leva das antigas também. Nada que a gente dê real valor hoje. Eu acho que estou meio pessimista hoje... :)


Davi com o piru de fora na obra de Michelangelo. Davi adorava ficar com o piru de fora.



Cassiane! A nossa musa evangélica!

o João é um provinciano

Conquanto meu ecumenismo não seja um ecumenismo de miolo mole, e eu admita que exista essa história de certo e errado, pretendo ater-me aqui apenas ao que nos é comum ater-me ao tal do “cristianismo puro e simples” de que falava Lewis. Será isso possível? É o que vamos a ver.

Mas o João falou em “olhares de reprovação” dos muçulmanos. Ora, João, digamos que eles tenham métodos mais drásticos contra isso de diversidade religiosa. Até.

quinta-feira, 26 de junho de 2008

As orações dos outros

O post introdutório do Igor, com sua oração pela unidade cristã, me lembrou um assunto sobre o qual tenho pensado bastante ultimamente: a estranheza, a sensação de algo bizarro, fora de lugar, que temos quando deparados com (ou participando de) cultos, cerimonias ou reuniões de outros grupos religiosos. E particularmente, grupos dentro do cristianismo. Posso estar falando por mim mesmo, pode ser provincialismo meu, pode ser que todos vocês tem reações completamente diferentes da minha, mas em geral me sinto mais estranho assistindo, por exemplo, uma missa na televisão do que assistindo o Dalai Lama falando numa entrevista (aparições públicas ao lado de celebridades sendo, afinal, o exercício espiritual máximo do budismo tibetano). Riam, se quiserem, mas acho o silêncio de um culto numa igreja batista mais conspícuo do que a gritaria de um terreiro. E acho que sei o motivo.

Existe um termo na robótica e na animação, "uncanny valley", ou "vale estranho", que designa o sentimento de revulsão que pessoas tem perante robôs ou animações que tem aparência quase humana. A teoria é que se um desenho ou um robô é cartoonish e irreal, comicamente desproporcional ou fofo ou propositalmente diferente de um ser humano, mas antropomórfico o suficiente para parecer uma pessoazinha, nossos olhos são atraídos pelas similaridades entre o robô e a figura humana, e isto gera simpatia pelo pedaço de lata. Mas chega um ponto onde a semelhança com seres humanos fica tão próxima que a nossa mente deixa de focar nas similaridades e passa a olhar para as diferenças, e de repente as incongruências e bizarrices do robô nos são repelentes. Por exemplo:



Johnny 5 de "Um Robô em Curto Circuito": Bom.



Esta abominação feita (onde mais?) no Japão: MAU.

E eis o problema do uncanny valley religioso. Um cristão pode olhar para, digamos, um budista meditando ou um muçulmano rezando em seu tapetinho e dizer "Hum. Estão errados." sem qualquer desconforto (exceto, talvez, pelos olhares de reprovação do muçulmano e do budista). Mas é estranho estar numa missa, ver um padre pregar da mesma Bíblia que você prega, tirar conclusões parecidas com as suas, e então- no meio, sem provocação ou motivo aparente- jogar a Virgem Maria no meio, ou terminar sua homilia invocando São Francisco. Vejo ícones ortodoxos, e quase consigo sentir o fedor doce de incenso e velas queimando lentamente, e patriarcas de longas vestes pretas e barbas abraãmicas dançam em minha cabeça, e a estranheza de que estas pessoas adoram o mesmo Cristo Jesus do que eu me faz ficar um pouco tonto. As similaridades são tantas que, de repente, as diferenças começam a gritar, e você começa a pensar que o anglicano com quem você está conversando deve acreditar também em pirâmides, e cristais, e em karma, e em poder kundalini. Se bem que com anglicanos, ultimamente, nunca se sabe.

Mas há um consolo nisto tudo. Esta estranheza é indicativa de proximidade, não de distância. Nossas discordâncias podem ser flagrantes e notáveis, mas são como manchas vermelhas num grande lençol branco de crença comum. E creio que podemos, cobertos por esta mesma fé, nos aproximar um dos outros, e nos fortalecermos e nos alegrarmos, e regozijarmos, na variedade que existe entre nós.

Até, é claro, um conseguir convencer o outro; ou se aproximar o suficiente do outro pra dar um golpe bem acertado de Bíblia em sua cabeça e arrastá-lo pro seu lado. Vocês esperavam o quê?

Bem, de qualquer forma, um brinde aos meus amigos estranhos, com suas orações estranhas e suas doutrinas estranhas, celebradas em seus cultos estranhos por seus líderes estranhos nas suas igrejas estranhas. Espero que a bizarrice dure por muito tempo ainda.

Pela unidade

Neste sábado, dia 28 de Junho, nós católicos veremos o início de um ano importantíssimo: Inicia-se um ano de orações pela unidade dos cristãos. Na vigília de São Pedro e São Paulo, também, espera-se a resposta da FSSPX à Santa Sé, que lhe ofereceu um acordo para anular as excomunhões de Mons. Lefebvre e de Dom Castro Mayer. A contrapartida da FSSPX são cinco pontos cujo único efeito é impedir o sedevacantismo na sociedade, o que temos fé será aceito.

Neste dia 29 de Junho, domingo de Nosso Senhor, a unidade da Igreja terá um maravilhoso impulso. E pela unidade na fé, incluindo nesta unidade meus irmãos amados João, Gustavo e Éber, rezaremos um ano inteiro. Enquanto não se completa o desejo de Nosso Senhor Jesus Cristo, de que haja um só rebanho e um só pastor, buscaremos aqui nos unir mais no que temos de central em nossas vidas: O sacrifício da Cruz, e sua promessa de redenção. Naquilo que nos separa, eu faço votos de nunca haver silêncio diplomático, tolerância religiosa, ecumenismo irênico: Quero antes devotar-me a Nossa Senhora, pela conversão de meus companheiros reformados, e que eles tentem me ungir, também, com os óleos que têm.

E por último, e realmente menos importante, neste domingo de São Pedro e São Paulo seria aniversário de meu pai. Que Deus o tenha em sua paz.

São Miguel Arcanjo, defendei-nos no combate; cobri-nos com o vosso escudo contra os embustes e ciladas do demônio. Subjugue-o Deus, instantemente o pedimos. E vós, príncipe da Milícia Celeste, pelo divino poder, precipitai no inferno a Satanás e a todos os espíritos malignos que andam pelo mundo para perder as almas. Amém.

Sacratíssimo Coração de Jesus, tende piedade de nós.
Sacratíssimo Coração de Jesus, tende piedade de nós.
Sacratíssimo Coração de Jesus, tende piedade de nós.