quinta-feira, 14 de agosto de 2008

Os motivos são outros

O que me incomoda um pouco é ver atribuírem ao meu cristianismo algo que não passa de uma mera questão pessoal, de temperamento, ou seja lá qual for o nome mais apropriado para significar, às vezes, não mais que um gosto. Se não saio por aí matando todas as pessoas que julgo desnecessárias, longe de ser por falta de vontade, é por acreditar que o valor da vida humana independe do que quer que eu pense — e porque, além disso, os Evangelhos me ensinam não só a não matar, como também a amar ao meu próximo, até mesmo ao meu inimigo, às gentes menos merecedoras. Quando eu digo, portanto, que nunca matei uma única pessoa em toda a minha vida, é justo que creditem esse meu histórico à minha moral religiosa, que prevalece sobre o meu impulso natural. Por outro lado, quando digo, por exemplo, que não freqüento certos lugares, não alimento certos hábitos, não o digo por ser, a rigor, um cristão, mas por achar que tenho coisas melhores a fazer: — “Ah, você não gosta de sair pra dançar? Você é de alguma igreja?” — “Olha, minha amiga, por um grande acaso, obra mesmo do destino, eu pertenço a uma igreja. Mas o que é que isso tem a ver com o fato de eu preferir passar minhas noites de sexta e sábado em casa?” Sei que pode parecer um escândalo (mais até para os de dentro que para os de fora), mas não há ligação alguma entre a minha crença na Trindade e meu desgosto por cigarros; entre minha esperança na ressurreição e meu desinteresse por cerveja.

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