quinta-feira, 31 de julho de 2008

Continuo aqui

Meu confuso, longo e animado texto sobre as relações entre o cristianismo e a política, que comecei aqui.

Terminava recomendando ao amigo Cristão hipotético que pense em votar nulo nestas eleições. Mantenho o conselho; já verá por quê.

Entre fazer o bem e evitar o mal, escolha o mais garantido. A certeza de praticar o bem é ótima, mas evitar o mal, se oferecer mais chances de sucesso, também não é ruim. Tudo depende das certezas que se tem; e muitas vezes nossas certezas dependem dos nossos ceticismos.

Dias atrás o João se surpreendeu de que eu acredite no Judeu Errante. Eu, de fato, acredito literalmente que há um Judeu andando pelo mundo desde que Jesus o condenou a isso. Se não houver, acredito que eu entendi mal. Mas não acredito que Jesus teria errado. Sua maldição aconteceu e caiu sobre alguém.

Mas o João acredita em algo que eu considero muito mais inacreditável. Ele acredita no dinheiro como fim único das grandes corporações, dos grupos que controlam não só nossa economia, mas também nossa política e nossa cultura. Assim, a cultura e a política estariam hoje submetidas ao grande capital, e por isso seriam malévolas.

Isso faria sentido, diríamos, se viesse de um comunista. A assimilação total de nossas vidas (quem nega que a humanidade está prostituída e escravizada?) visando a uma enorme acumulação financeira nas mãos de uma elite é um excelente ponto de partida para prometer ao povo a libertação pela igualdade econômica. E sabemos onde isso vai dar.

E é, também, uma boa prova de nossa corrupção geral. É mais fácil, e mais garantido, olhar um efeito e apontar sua causa do que observar um evento e deduzir suas conseqüências. Profecias, se têm base natural, costumam falhar. Marx falhou.

Mas não estamos aqui para ser anti-comunistas. O fato concreto é que há uma elite que controla as vidas das pessoas. E isto dentro da sociedade que se pretendeu liberal, isto é, que não queria ser controlada pelo governo. Hoje somos livres de impostos em muitos países, mas a cultura em que criamos nossos filhos está carregada de uma carga opressora tão intensa, que pouco adianta pretender fazer, de nossos filhos, filhos nossos. Eles serão filhos de seu tempo, a menos que vivamos a paternidade e a maternidade em grau esforçado, tentando o heróico.

E isto é só um problema, óbvio para mim, que sou pai. Há muitos outros: As concessões necessárias para ter uma vida acadêmica e para ter um emprego; para encontrar um cônjuge espiritualmente vivo e ativo; para fazer bons amigos.

Tudo estaria muito bem, e o liberal estaria certo, se fosse lucrativo manter os povos assim. Mas não é. Não é só no filho, na esposa e no amigo que somos amputados: É no padeiro, no prefeito e no controlador de vôo. O progresso quase que só nos trouxe atraso. Temos TV a cabo, ensinando libertinagem às crianças, rebeldia aos adolescentes e pornografia aos adultos. Temos internet para mais eficiente distribuição destes mesmos frutos podres. Temos celular para maledicência e mentira mais eficiente.

Morremos de medo de se acabarem a água, o petróleo e a comida, e não lembramos que precisamos de gente que nos tirem a água dos poços, o petróleo dos mares – ou inverta-se – e a comida da terra. Mas hoje, com controle populacional e egoísmo institucionalizado, não há lucro financeiro vindo disso. Não foram só o filho, o marido e a amiga que pioraram: Foi o pão, a casa e o asfalto da rua.

Se alguém levantar aqui a mão para dizer que estes maus efeitos não são sinal de crise econômica, mas de excessiva concentração, eu respondo que, primeiro, o capitalismo sempre quis o dinheiro circulando, e que portanto não é bem uma sociedade liberal aquela em que tais coisas acontecem; e depois, que o próprio liberalismo, ao cortar as amarras entre o trabalho e a moral, abriu a porta que permite o enriquecimento exagerado. O liberalismo preparou a tirania econômica.

Que o comunismo e o capitalismo, bem como o estatismo e o liberalismo, são uma e a mesma coisa com camisas diferentes, basta estudar história para saber. Suas semelhanças ficam fáceis de observar no parágrafo acima. É esta mesma coisa, e suas inúmeras camisas, que pretendo expor e combater aqui.

Peço que o leitor observe o seguinte fato: O Capitalismo, enquanto maneira de desempenhar as atividades produtoras, extrativas e beneficiadoras de maneira a permitir máximo lucro, e o Estatismo, enquanto maneira de governar através de extrema intervenção do governo na vida econômica do país, isto é, nas mesmas atividades mencionadas, têm seu primeiro surto quase juntos. A avareza segue à gula muito de perto.

E o que causa estes dois eventos foi um silêncio. Um estranho silêncio, pois alguém ainda falava. Mas ninguém ouvia, e ninguém lia seus lábios: Estavam todos muito ocupados lendo entranhas de cadáveres e buscando a pedra filosofal. Um silêncio de uma voz que diria, e dizia e diz ainda que é feio ser guloso, e se empanturrar; e empanturrado, é feiíssimo ser avarento, e reter. Mas quem dá ouvido a esta voz?

Quando achamos normal sermos legislados e julgados por gulosos e avarentos, quando fazemos manifestações e comícios pelo direito de dar a estes gulos e avarentos o poder com o qual se alimentam e nos fazem morrer de fome – poderemos reclamar, depois, de sua preguiça, de sua ira e de toda a sua Corrupção?

Por isso, eu lhe exorto, leitor amigo – na dúvida (e você provavelmente tem do que duvidar), vote nulo.

(continua)

2 comentários:

Unknown disse...

Igor, como eu já disse antes, defendo o liberalismo/capitalismo como o mal menor, como- de todas as formas de sociedade e economia- a menos daninha, destrutiva e controladora. Entendo que é natural que muitos (que talvez a maioria) discorde, e eu entendo perfeitamente, porque a minha defesa disto já é coisa desanimada e sem fé.

Porém: se vamos recusar tanto o liberalismo quanto o estatismo e qualquer coisa mais, minha pergunta é: qual é sua alternativa? Você mencionou o feudalismo. Como fazer o feudalismo funcionar numa sociedade como a nossa, num mundo como o nosso, com a população do tamanho da nossa e com as necessidades de um mundo como o nosso? E mesmo se conseguirem desenvolver um novo modelo feudal viável- este feudalismo seria desejável?

Igor disse...

João, a resposta vem na terceira parte do post. É que eu esqueci do "continua", desculpe.
Minha alternativa não é bem o feudalismo, mas sim o Regnum Christi; já o veremos.
Abraços,